Reportagem – Na época da Cereja

Visita à Casa da Cereja de Alcongosta

Como Pedro Silveira diz na sua crónica desta edição, estamos na época do “Ouro vermelho Cova da Beira”. Este produto endógeno na Cova da Beira tem vindo a ser valorizado e é já uma referência a nível Mundial.
Dizemos a nível Mundial, com a consciência que o Mundo é muito grande e que há milhares de regiões onde também se produz cereja, assim como outras zonas em Portugal, mas a denominada Cereja do Fundão que se produz neste concelho e em toda a zona envolvente tem características ´consideradas únicas, ao nível da textura e dureza da pele, bem como e sobretudo da doçura e sabor do miolo.
Em 2016 a Câmara da Covilhã, criou na freguesia do Ferro o Centro Interpretativo da Cereja que nasceu como um projeto inovador, a nível nacional e mostra o processo produtivo da cereja. Este espaço, muito assente numa comunicação multimédia mostra aos visitantes o panorama paisagístico, processo produtivo e utilização da Cereja, como uma marca também desta freguesia. “Com uma janela virada para a Serra da Estrela, o CIC encontra-se sediado no Ferro, uma vila rodeada por pomares de cereja, que vale a pena visitar em qualquer estação do ano”. Salienta o seu folheto informativo da Câmara Municipal.


O Ferro realiza todos os anos a Feira da Cereja que apenas foi interrompida pela pandemia em 2020 e 2021, mas este ano regressa à rua nos próximos dias 3, 4 e 5 de junho, com comercialização de cereja e muitos outros produtos agrícolas.

Casa da Cereja em Alcongosta
Já mais recentemente e fazendo jus à identidade de uma das suas aldeias, a Câmara Municipal do Fundão inaugurou em 2021, a Casa da Cereja que nasce da reconversão da antiga Escola Primária de Alcongosta, aldeia na Serra da Gardunha. Assume-se como um espaço museológico, inclusivo e para todos, de aprendizagem e descoberta, onde podemos ficar a saber mais sobre o ‘‘ouro vermelho’ da serra da Gardunha.
A sua inauguração em plena pandemia e com os tempos que se seguiram não foram para o Correio de Caria. os mais oportunos, mas a visita estava prometida e com a finalidade de reportagem para esta edição deslocámo-nos a Alcongosta, fomos recebidos no Museu pelo funcionário Sr. Alexandre Leonardo que nos acompanhou em visita guiada pelo espaço.


Começámos num primeiro espaço com uma abordagem ao simbolismo da cereja no decorrer dos tempos e em todo o Mundo, quase sempre ligada à natureza, à fecundidade e à criação: Seguindo depois noutro espaço para a descoberta da árvore, nas suas várias fases desde a dormência, no Inverno, à faustosa floração, o exímio trabalho das abelhas no processo de fecundação, o crescimento dos ramos e dos graciosos frutos, à minuciosa colheita (salientar que a cereja para sua boa conservação tem de ser sempre colhida com o pé, não podendo por isso ser “ripada” obrigando a que se faça com a ponta dos dedos, polegar e indicador, normalmente). O seu embalamento e limpeza que também tem de ser muito cauteloso, permitirá uma escolha e seleção de acordo com amadurecimento e calibre. Aqui encontramos as antigas caixas de Madeira que eram forradas com folhas de cerejeira ou fetos, agora substituídas pelas práticas caixas de cartão que também ajudam a consolidar a marca.


Prosseguimos depois para uma viagem pela cereja no mundo, ficando a conhecer as variedades e a saber como se fez a implementação deste fruto em Portugal. Numa enorme cerejeira em madeira e em flor, no centro da sala figura a palavra cereja escrita em todas as línguas. Exemplos de como a cereja é vista pela arte ou como a sua produção tem evoluído são outras vertentes abordadas no primeiro piso dedicado também “à biologia e anatomia da cereja e da cerejeira”, mas também à sua implantação no mundo. Com um painel na parede e um globo terrestre, em madeira, no centro de outra das salas é possível apreciar, a nível mundial, quem são os maiores produtores e os que têm maior quantidade de pomares de cereja: Com grande destaque para os Estados Unidos e ao nível da Europa para a Turquia e para o Irão, no médio oriente. Sendo que a sua produção se associa sobretudo a um clima mediterrânico.
Descobrimos depois a serra da Gardunha, que consolida condições especiais favoráveis para o desenvolvimento das cerejeiras e a qualidade da cereja. Em Portugal produzem-se cerca de 20 mil toneladas de cereja por ano e estima-se que o Fundão (entenda-se concelho do Fundão e zona envolvente) representa cerca de 15 mil toneladas. Mas acima da quantidade está a qualidade e garantem os especialistas que o “brix” desta cereja é único e também por isso a “Cereja do Fundão” é um produto certificado com IGP – Indicação Geográfica Protegida (Produtos agrícolas e géneros alimentícios), Entendendo-se por “Cereja do Fundão” o fruto proveniente de cerejeira (“Prunus avium L.”) que tem como principais características: Calibre igual ou superior a 24 mm; Consistência com índice Durofel igual ou superior a 60; Coloração entre o índice 2 e o 6 da tabela de coloração do CTIFL; Conteúdo de sólidos solúveis iguais ou superior a 12º Brix.
Um produto de que se faz já muita exportação, mas onde se pode expandir a produção, pois segundo nos disse o nosso interlocutor, “o mercado nacional absorve tudo o que cá seja colocado e mais se houvesse”.
Alcongosta é considerada a aldeia emblemática da Cereja do Fundão, onde todos os anos é celebrada na Festa da Cereja, e este ano acontece nos dias 9, 10 e 11 de junho, em Alcongosta.
Terminamos a visita com o convite para descobrir mais sobre esta aldeia, onde a cereja se enraizou e transformou a paisagem humana e natural. Mas como não apenas de cerejas vive o homem, esta localidade também era abundante em castanheiros que forneciam madeira para os cestos e por isso se tornou emblemática pelos seus cesteiros que produziam as cestas e cestos para as cerejas, mas os quais também têm utilidade em inúmeras funções da atividade agrícola. Está aqui muito bem representada a atividade dos cesteiros, desde a recolha da madeira à preparação das ripas e fabrico das cestas, com uma oficina, onde os artesãos fazem demonstração e o visitante pode experimentar o material. Boa referência é aqui feita também aos Esparteiros, outra ativididade que consistia em trabalhos com esparto.


A Casa da Cereja, para além da sua natureza museológica, é também um local de partilha e experiência da comunidade, bem como, para quem a visita. Este espaço faz parte da rede das “Casas Lugares do Sentir – Centro Unesco do concelho do Fundão” e que compreende: a Casa do Barro, no Telhado; a Casa do Bombo, em Lavacolhos; a Casa da Poesia Eugénio de Andrade, em Póvoa da Atalaia; a Casa da Romaria de Santa Luzia, em Castelejo; a Casa das Memórias António Guterres, em Donas; as Casas dos Ofícios, em Soito da Casa; as Casas do Folclore, em Silvares; a Casa do Pastor, em Salgueiro; e a Casa da Cereja, em Alcongosta. pretendendo contribuir para a preservação do importante património material e imaterial da região da Cova da Beira. jhs

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