Depois de um longo verão quente e de tanta brincadeira na rua, eis que chegou o meu primeiro dia de aulas. Tinha 6 anos e uma forte cabeleira que me cobria as orelhas. Levantei-me muito cedo, ansioso… para o meu primeiro dia de escola! A paisagem enfeitava-se com o castanho, o vermelho, o amarelo e o laranja do outono. A escola ficava ao fundo da rua e à entrada já se encontrava a Senhora Professora, que esperava pelos seus alunos para lhes dar as boas vindas.
Na altura era muito alta, mas tinha umas mãos pequenas e umas alianças de prata e ouro entaladas nos dedos. Gostei logo dela, era simpática, acolhedora, brincalhona, afinada e muito sábia.
Chama-se Maria Alice Pinto, a Professora Maria Alice, que é sobejamente conhecida em Peraboa e não só. Faz anos no dia dos namorados e atualmente domina as novas tecnologias. Já tem a bonita idade de 92, pelas minhas contas. De quando em vez trocamos mensagens e estamos em contato via telemóvel devido à pandemia. Também faz parte do meu rol de amigos no facebook.
Como já deram conta, hoje vou falar da minha querida professora primária, apesar de outras existirem que marcaram a minha vida e que me indicaram caminhos, a Laura e a Lurdes. Contudo, foi a Professora Maria Alice que me ensinou a interpretar os primeiros sinais para descodificar o mundo. É uma mulher de convicções e gosta de poesia. Tem uma Fé inabalável. A nível de prática pedagógica, poderei mesmo afirmar que a minha professora usava métodos inovadores para o ensino das consoantes e das vogais, ditongos e afins, associando a música à caraterização das letras. Usava as cores, as figuras geométricas que eram pintadas com diversas cores para avaliar o nosso desenvolvimento na leitura. O meu primeiro livro de leitura e de fichas de língua Portuguesa chamava-se “Antoninho”. Eram diversas histórias, dentro da mesma história. Eram aulas intensas, cheias de ação, de criatividade, de mimos, de alegria, de sonhos e de esperança. Tinha um grande conhecimento académico e adorava a sua caligrafia. A Professora adotou Peraboa, como sua terra, juntamente com o seu marido, o nosso saudoso Professor Eurico. A professora Maria Alice também era enfermeira, mãe, entre tantos outrist papéis que desempenhou. Foi ela que me ensinou e a dezenas de gerações de crianças a ler, a escrever e a contar, com muita habilidade.
O seu pequeno Toyota andava sempre cheio de garotada e até levava os miúdos ao hospital, em caso de necessidade. Tinha uma cadela gorda e também ela fazia parte da nossa família escolar. Naquele tempo, as quatro salas estavam repletas de alunos desde de manhã até à noite com a Telescola.
Memórias… já perto das longas férias grandes, a professora Maria Alice mandou-me dez lotos. Era uma espécie de sopa de letras para construir frases para o treino da escrita e da leitura. No primeiro e segundo dia de férias arrumei com o assunto, com os TPC´s das grandes férias de verão, para passar os quatro meses sem grandes preocupações com as contas e com as cópias. Meu Deus, que aflição!!(risos).
A Casa da minha Professora era frequentada por todas as crianças, brincávamos à volta da grande mesa em granito e agraciava-nos com um delicioso bolo de canela. Lá em casa andava sempre com os rolos no cabelo. Era e é vaidosa! Pelo Natal realizavam-se grandes saraus culturais no armazém que ficava ali em frente à escola, na escola velha e no salão do padre. No dia da minha primeira comunhão fomos tomar o pequeno almoço à casa da nossa professora. Foi um dia muito feliz para o nosso grupo, que chegou a eternizar esse momento em fotografia. Falar da minha Professora é sempre uma árdua tarefa, pelas histórias vividas e pela presença que teve ao longo da minha vida e de tantos alunos que ajudou a formar com mestria e perícia, em Peraboa. Sempre esteve nas nossas vidas, eu talvez nem tanto, talvez pela desculpa do “tempo”. Acreditem, é com enorme satisfação que continuo a receber mensagens e telefonemas da minha querida amiga professora. Fica muita coisa por dizer e por escrever.
Apenas lhe quero dizer publicamente: obrigado pelos afetos, pela forma como nos ajudou a descobrir a felicidade, a mim e a tantos outros alunos que passaram pela sua vida. Até Breve!