As delícias da nossa culinária pascal

Paulo Silveira
Dirigente Associativo
Três Povos

No final do século XIX, afirmava o escritor Fialho de Almeida: “Um povo que defende os seus pratos tradicionais, defende o território”. Esta frase, por vezes citada no contexto da genuína cozinha regional( lembremos, de passagem, uma significativa resolução do Conselho de Ministros, de 26/07/2000, que “ considera a gastronomia portuguesa como um bem imaterial integrante do património cultural), vem, por exemplo, no volume “Cinco Séculos à Mesa”, de Guida Cândido (Dom Quixote, 2016)), um trabalho apreciado por todos os que se interessam pela história e sociologia da alimentação.

A este respeito, merecem observação cuidada as muitas e criativas formas de celebrar a Páscoa à mesa. Nesta quadra festiva, abastados e/ou humildes, não dispensam os deliciosos sabores ancestrais, sem adulteração (mais ou menos “gourmet”), como, entre outros manjares, o cabrito assado na brasa ou no forno, borrego no forno ou de ensopado, o leitão assado e a doçaria caseira (bolos doces, bolos de azeite, esquecidos, cavacas, bolos de soda, etc.)

Parafraseando Vasco Teixeira, in “Comidas e Práticas do Sistema Alimentar na Região do Fundão (ed. Colibri, 2005) “…é às refeições de Sábado e, especialmente, ao almoço de Domingo de Aleluia, que cabem as comidas mais representativas do carater de exceção do regime alimentar e dos modos de cozinhar locais”.

Ainda a propósito dos paladares e das vivências marcantes, permita-se-me a brevíssima e curiosa evocação de Leonor Trigueiros de Aragão, autora de “ Quintãs, uma aldeia da Beira Baixa”(1994): No Domingo de Páscoa os padrinhos dão o “afolar” aos afilhados, uns bolos regionais como as sodas, os esquecidos, as cavacas, os pães-leves ou, os típicos bolos de azeite e bolos doces, de tamanho grande, além das amêndoas recobertas com açúcar. No fundo, “a tradição do folar, qualquer que ele seja, assenta num ritual de dávida, solidariedade e convívio profundamente enraizado na sociedade portuguesa (cf. Lurdes Modesto e Afonso Praça. (Festas e Comeres do Povo Português, vol.II (Verbo,1999).

E, para sobremesa, parece-me pertinente concluir estas notas recordando a histórica recomendação de Ferreira Lapa, um dos primeiros estudiosos do afamado ( e simbólico por excelência) queijo Serra da Estrela, para tirar o máximo proveito da “Tecnologia Rural” junto dos lavradores Beirões: “ Façam-se bons leites com boas raças e bons pastos, e haja preceito, esmero e limpeza nos fabricos, que podemos obter de lacticínios saborosos e delicados a bastança que nos vem do tributo pago ao estrangeiro”.

Aproveito para desejar a todos os leitores do “Correio de Caria” uma Feliz Páscoa “passando” a receita ancestral de uns bolos de “folar”, de uma cozinheira, doceira e “bodeira” de casamentos, a D. Silvana já falecida, do Monte do Bispo freguesia de Caria.
0,5 de açúcar
9 ovos
¼ de leite
½ litro de azeite
1 colher de sopa de bicarbonato de soda
1,5 k de farinha Branca de Neve
Misturar o açúcar com os ovos, deitar o leite o azeite a colher de bicarbonato e a farinha por último. Amassar bem, tender os bolos, meter num tabuleiro, pincelar com gema de ovo e açúcar e levar ao forno.

“Bom proveito” car@s leitores!

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