Cereja, “O ouro vermelho” da Cova da Beira

Pedro Silveira
Professor do Ensino Básico

É um dos frutos mais saborosos da época, a cereja, que aparece no esplendor da primavera. É o tempo delas, das nossas cerejas tão desejadas, que são claramente um marco importante para a economia local. São milhares de forasteiros que procuram viver a experiência da “apanha” da cereja diretamente da cerejeira. São os novos “romeiros” da cereja, que esperam um ano para se deliciarem com o fruto da tentação. É algo único e saboroso, a sua polpa, aquela sensação, como se fosse um fruto proibido. A sua cor avermelhada “que se mete pelos olhos adentro “. Elas, as cerejas, na minha opinião tanto são apetecíveis de manhã, como à tarde e como à noite. Vou contar-vos uma história engraçada: um dia entrei com duas caixas de cereja num teatro da Capital para oferecer a uns conferencistas. Ao passar com as cerejas gordas, de calibre elevado, o público que assistia à conferência agitou-se, reagindo de tal maneira que os oradores acabaram por comentar o sucedido. De repente, passo a ser o personagem principal do evento (risos) – o efeito que a cereja pode provocar. Se eu tivesse ali um camião carregado de caixas de cereja, eram vendidas num ápice. Esse efeito nas pessoas deve-se à inovação do Município do Fundão, pela sua enorme capacidade de promoção da Cereja do Fundão, que teve início nos inícios do século. Um marketing assertivo que mudou a paisagem das nossas terras. Se eu disser a alguém desconhecido “sou do Fundão”, ouvirei certamente de volta “É da terra da cereja.”
A marca do Fundão vai para além da cereja, como o bom queijo, mas a cereja do Fundão já está enraizada na cultura do povo português. Foi, verdadeiramente, uma aposta ganhadora e que o nosso território tão bem soube aproveitar – o “ouro vermelho” das Beiras. Esse vaivém de autocarros pelas quintas a saborear as nossas cerejas é extraordinário, como acontece na Quinta do Limite, em Peraboa.
O fruto é proveniente da cerejeira (“Prunus avium L.”). Tudo indica que a cereja chega à Europa pelo Geral Romano Lucullus, que trouxeram a ginjeira. Seja como for, continua a ser um sucesso e toda a gente lhe rende homenagens, quase como um símbolo sexual. Em 1845 já se falava da cereja do Fundão e das suas freguesias.
Ao longo da história, a cereja ganha adeptos na arte, pois continua a ser um motivo de inspiração para escritores, pintores, poetas. Significa que a cereja sempre foi muito apetecível, inspiradora. Por cá, a cereja tem Confraria e tem dois certames, como é caso da Festa da Cereja, em Alcongosta e a Feira Agrícola da Cereja, no Ferro. Ambas se realizam em junho.
Se visitar a Casa da Cereja em Alcongosta, vai descobrir toda a história da cereja no mundo e a nível local, a Serra da Gardunha. É um espaço que faz parte da Rede de Casas e Lugares do Sentir do Município do Fundão e que dá a conhecer a nossa cereja. Lá podemos descobrir uma panóplia de produtos à base de cereja, como licores, compotas, dezenas de outros. Vale a pena visitar, é obrigatório.
Nas pastelarias locais, encontramos os bombons de cereja e os famosos pastéis de cereja, entre outra doçaria que o Fundão nos oferece à base de cereja. Vejam só, até os caroços das cerejas são aproveitados. Quanto aos pintores, aos artistas, destaco alguns, como Caravaggio, Senhor e Dono do Barroco inspirou-se na cereja, assim como Antoine Boidoin. Quanto à cerâmica, não nos podemos esquecer da Louça de Caldas, cuja cereja aparece figurada em jarros e outras peças. Até os estilistas se inspiraram na cereja.
Quanto aos maiores produtores de cereja a nível mundial, saliento a Turquia. A cereja da Cova da Beira é a melhor de Portugal, pelo seu grau de açúcar, as condições climáticas da região, que lhe confere um saber autêntico. Não nos podemos esquecer dos produtores de cereja, os grandes obreiros, que durante o ano se dedicam com “alma” ao trato das cerejeiras. A expressão “a cereja no topo do bolo” representa uma recompensa, algo superior, como uma coroação, que o melhor ainda está para vir, o seu açúcar. Gosto do adágio: “As conversas são como as cerejas”, que usamos popularmente entre uma boa conversa. Os mais antigos diziam “cerdeira” para designar cerejeira. “Ir roubar cerejas” era costume da pequenada, pois nem toda gente tinha uma cerejeira. Recordo-me das cerejeiras que tinham quase dez metros de altura, que o seu fruto era vendido na árvore e já na altura rendia uma fortuna. Atualmente, com as novas tecnologias conseguimos reservar e comprar uma caixinha delas num instante, basta teclar num telemóvel. Há dezenas de variedades e a esperança média de uma cerejeira chega a 30 anos. Num restaurante da região saboreei arroz de cereja. O furor da cereja na gastronomia. Independentemente das modernices, eu adoro comer cereja logo pela manhã, à fresca, junto à cerejeira. Tem preço? O mundo rural também nos proporciona essas coisas, essas sensações, que não têm preço. … A área geográfica de produção da “Cereja do Fundão” chega a Norte das freguesias de Ferro e Peraboa, no concelho da Covilhã.
Vai uma cesta de cerejas de saco da Cova da Beira?

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