Opinião de Manuel Geraldes
Médico
Natural e residente em Caria
A pandemia associada à COVID-19 é um flagelo. Assola as nossas vidas, tem um impacto sanitário, social e económico, representa um sério desafio a todos nós, enquanto cidadãos centrados na família e na sociedade
Apareceu do nada, não avisou, por isso não nos preparámos e ainda não estamos preparados, porque não temos conhecimentos suficientes. Temos medo do quotidiano, do desconhecido e daquilo que julgamos conhecer. Desconfiamos porque a certeza está rodeada de incertezas.
A estrutura social está a desmoronar-se, apontamos o dedo a quem nos governa, porque não toma medidas, se as toma já devia ter tomado ou então devia tomado outras (erro crasso, o alivio das restrições no natal e passagem de ano), se implementa restrições não as cumprimos; acusamo-nos uns aos outros quando não temos comportamentos seguros (e com razão!), quando não acatamos e não cumprimos as medidas e restrições instituídas. Enfim a humanização das relações em sociedade, o riso espontâneo dos lábios, a saudação rasgada começam a esbater-se; a crispação, a exaustão e a radicalização de opiniões passam a ser a normalidade do dia-a-dia, a par de um impacto muito expressivo no comportamento das pessoas. O distanciamento social e o uso da máscara de proteção são uma barreira à socialização e à comunicação. A distância física impede um abraço apertado, um beijo e o toque, essenciais para demonstrar e tornar mais fortes os sentimentos e afectos. Embora não seja fácil termos a noção exacta do real impacto na saúde, mental e física, há um risco acrescido de adoecer ou fragilizar o nosso bem-estar do ponto de vista psíquico.
Não se conhecer o fim, não se saber se serão mais umas semanas, meses ou anos, ou não se ver a “luz ao fundo do túnel”, é uma condição determinante do medo e angústia, ansiedade e depressão. Este fenómeno, de forma continuada, está na origem da situação a que a OMS chama de “Fadiga Pandémica”.
Os sinais de “fadiga pandémica” são caracterizados pela desmotivação para obedecer a comportamentos de protecção recomendados. Têm-se instalado ao longo do tempo de forma gradual e progressiva, a nível individual e colectivo. São influenciados por um conjunto de emoções, experiências e percepções que levam, também, ao facilitismo, relaxamento e erros de avaliação, bem como à atitude de “laissez faire, laissez passer”.
Porque as infecções estão a aumentar de uma forma descontrolada, bem como o número de hospitalizações e óbitos, é preciso libertar as pessoas do medo e da apatia. As pessoas estão cansadas e têm direito ao cansaço. É urgente voltar a envolvê-las no cumprimento das medidas de prevenção, exigir a responsabilidade individual, colectiva e social, sem as culpabilizar. Motivar e mobilizar. É preciso aproximar as pessoas da informação e comunicação; comunicar com humanização, atribuir significado emocional aos números, olhar para eles como pessoas.