Como já é referido em vários testemunhos desta mesma edição, o 25 de Abril de 1974 exerceu transformações tão grandes e tão profundas na nossa sociedade que já se tornaram indiscutíveis e nada as faria prescrever:
- O Serviço Nacional de Saúde, cuja importância muito bem se sentiu nesta situação de pandemia.
- O ensino geral Unificado e Gratuito que também ficou evidente nesta necessária adaptação ao ensino à distância.
- A União Europeia com a abertura do espaço europeu a todas as atividades e agora tão evidente neste desafio sobre as vacinas.
- O poder Local Democrático e as progressivas descentralizações de gestão e competências…
- O fim da Guerra Colonial, cuja diferença ainda pode testemunhar a geração que por lá passou.
Já quanto aos grandes sonhos do 25 de abril não é igualmente claro que fossem plenamente adquiridos, alguns não tenham mesmo prescrito e outros não estejam em risco de prescrever.
Não faltam exemplos de laivos de arrogância, centralismo, viciação de sistemas para eternizar poderes, em escalas que são transversais nos órgãos de poder, nas instituições sociais, nos próprios partidos, nos sindicatos, nas associações, na relação destes com empresas, criando e alimentando redes de interpendências que vão de favores políticos a favores económicos, pondo em causa a igualdade de oportunidades prometida no 25 de Abril.
Em consequência não faltam exemplos de autocensura, como se fossem os restos de um fascismo perdurante, que de forma mais subtil igualmente limita a liberdade de expressão e a liberdade de participação social.
Onde estão os arautos do 25 de Abril que agora se submetem aos tráficos de “mesquinhas influências” e branqueamento de “capitais favores” por conveniência no seu negócio ou emprego, ou pelo emprego de um seu familiar?
O clima de “Paz Podre”, falta de debate que se apoderou de tantas instituições, dos meios sociais e até do interior dos partidos políticos, será condizente com o 25 de Abril?
Em consequência assistimos a um descrédito dos valores democráticos onde populismos radicais e nacionalistas, ganham espaço e ameaçam a própria democracia. Ao mesmo tempo, em vez de se olhar para dentro, assobia-se para o ar e nos concílios da alta politica forjam-se leis e “leisinhas” inquisitórias, para limitar e até impedir o acesso eleitoral a grupos de cidadãos independentes…
Numa ocasião em que tanto se fala em prescrição, sobretudo quando se trata de fazer justiça sobre “crimes de colarinho branco”, será pertinente trazer à liça os sonhos do 25 de Abril e as suas frustrações, pela forma como vemos tantos dos proclamados revolucionários de há 47 anos, os tornarem prescritos pela sua acção quotidiana, em nome da mesma democracia…
Jorge Henriques Santos
jornalista CPJ nº3354A