Sem podermos ainda lançar foguetes, Portugal tem-se saído bem no que toca à pandemia. Já se apontaram diversas explicações para o milagre, como a boa liderança política, decisões atempadas, a vacina da BCG, a baixa densidade de algumas regiões, as nossas características de povo obediente, ou, o mais provável, a conjugação de muitas variáveis, entre elas a dedicação e competência dos profissionais de saúde.
Ainda assim, poderíamos ter cuidado melhor do sector social, que abrange uma fatia grande dos mais vulneráveis. Tardámos em agir, quando já conhecíamos as más notícias de Espanha e de Itália e andámos demasiado tempo a falar mal das máscaras, só porque não as havia, quando até as podíamos fazer em casa.
Por uma vez, as regiões interiores ficaram em vantagem, e não fossem alguns descuidos (a maior parte vindos do meio hospitalar), teríamos passado incólumes nesta primeira vaga.
Já para as grandes metrópoles, a pandemia tem sido arrasadora, mostrando o que há muito se sabia: que não se deve colocar os ovos todos no mesmo cesto.
Sabemos todos que é mais caro dispersar os recursos pelo território, mas vale a pena esse esforço por muitas razões que não vêm agora ao caso. A concentração excessiva da população terá, mais cedo ou mais tarde, consequências devastadoras. Se não for por um vírus, há-de ser pela guerra, pela poluição, por tempestades, ou por quaisquer outros fenómenos tão imprevisíveis como naturais. Longe vá o agouro, mas é a realidade do mundo global em que vivemos e não podemos pensar que só acontece aos outros. Quem diria que a superdesenvolvida Nova Iorque enterraria os seus mortos com retroescavadora, em valas comuns, ou que os deixaria a apodrecer em câmaras de frio?
Já se sabe que o capitalismo nos aperta o cerco, sempre pronto a alimentar-nos em manjedoura corrida e a colocar-nos a todos no mesmo bardo! Sai mais barato e dá mais lucro! Dispersar a população vai contra os cânones da economia, é contra o efeito de escala, dizem! Mesmo os regimes democráticos que tinham por obrigação contrariar os interesses, tendem a entrar no ciclo vicioso dos votos que pedem benesses e nas benesses que caçam votos para não falar de outras maleitas.
O tipo de povoamento nacional, que com exceção de uma estreita faixa litoral, é o da pequena povoação foi agora de uma inegável mais-valia, com as comunidades locais a fecharem-se sobre si mesmas, a vigiarem as entradas de forâneos e a colocar ferrete em eventuais suspeitos.
O distanciamento que se exige para as atividades económicas, é um equilíbrio muito difícil na grande cidade, onde os espaços são exíguos e caros. Espaço é coisa que felizmente não falta no interior, onde muitas atividades mais facilmente acusaram os efeitos da meteorologia do que os da pandemia.
Resta saber se aprendemos a lição ou se teremos que esperar por outras pandemias para começarmos a inverter tendências. Se saberemos aproveitar esta boa imagem que demos para o exterior, muito pelo desempenho do interior, para relançarmos alguns sectores de forma mais homogénea, como o turismo e as actividades ligadas ao território.
Diz a sabedoria popular que cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal e essa terá que ser a estratégia no imediato para a reabertura, conciliando a boa informação com a conduta social, criando a confiança necessária para o tal “novo normal” de que tanto se fala. Mas temos também que ser capazes de transformar as dificuldades por que passámos em oportunidades para mudar e as regiões interiores podem e devem reclamar essa mudança.