Vivemos um período singular, sem paralelo na nossa história local e regional, nem Nacional, Europeia ou Mundial. De repente a realidade e os problemas da nossa aldeia, são os problemas do Mundo e o assunto que é falado no “balcão” da nossa escada, é o mesmo dos noticiários nacionais, da BBC, da CNN e do New York Times.
Diz-se que o Mundo não voltará a ser o mesmo, que muitas coisas vão mudar e que um novo paradigma irá surgir… Os mais céticos, alguns astrólogos e algumas seitas religiosas, trazem discursos apocalípticos, sobre a saúde, a vida social e a economia. Outros mais optimistas falam numa retoma que não será repentina, mas será eficaz e nos pode tornar mais vigorosos e assertivos. Preferimos acreditar nestes segundos…
Porém sem saber o que o futuro nos reserva, sabemos para já que esta paragem forçada nos proporciona um momento de reflexão, por ventura de novas descobertas e para já de afirmação de novos valores… Descobrimos que a nossa casa e a nossa família não é apenas um local de repouso e relaxamento, mas se torna também em espaço de refúgio e até de trabalho; Descobrimos que os grandes heróis da humanidade, nos nossos dias não são mais os heróis das armas e conquitas que temos em estátuas nas nossas cidades e descobrimos que os médicos, os enfermeiros, os auxiliares de saúde, os professores, os técnicos e auxiliares dos lares de idosos, são os combatentes da linha da frente na nossa sociedade moderna, que por sinal têm sido bastante secundarizados. São essenciais para manter a estabilidade da nossa vida e o cuidado dos nossos idosos; Descobrimos que há coisas mais importantes que o défice, o superáfice, as taxas de juros e a mais valia do trabalho; Descobre-se até que o petróleo gerador de tantas guerras e conflitos, já não é um ouro negro tão precioso e os produtores de grude, chegam a anunciar que o dão ao preço de custo, ou até com défice…
Esta crise veio também por em evidência outra realidade em termos da administração pública. Inteligentemente o Governo nomeou cinco Secretários de Estado Regionais, para acompanhar de perto a realidade de cada região. O papel das Câmaras e Juntas de Freguesia, ganhou evidência na criação de respostas locais, em termos de uma proximidade que já exerciam mas nem sempre era reconhecida… As organizações locais de Saúde e Proteção civil revelam a importância do seu papel funcionando em rede e talvez se descubra a importância de terem Planos de Emergência devidamente atualizados…
Também a comunicação social levou um murro no estômago, com reflexos no poder politico, demonstrando a quebra de receitas da economia, que não pode prestar um serviço público dependendo apenas do mercado, como pela necessidade de se reinventar separando o essencial do acessório com o público precisar de informação verdadeira e credível.
Naturalmente que como em todas as crises há sempre quem venha à boleia do entusiasmo e da necessidade do momento, desde o chico-espertismo de empresários que aproveitam para fugir às suas responsabilidades, ao politiquismo de quem todos os dias anuncia novas medidas e iniciativas, algumas cuja efectivação é duvidosa, outras que não chegarão sequer a passar do anúncio…
Uma palavra ainda para o 25 de Abril e a crispação que se abriu sobre a comemoração na Assembleia da República. Daqui por uns tempos, iremos todos olhar para trás e sorrir, mas a falta de assunto levou a que uns quisessem se desse conta de si pelo seu reacionarismo, outros que a pretexto de democracia afirmassem a ditadura da maioria. Acabou tudo bem e o Presidente da Republica disse o que tinha de ser dito. Crise significa mudança, ruptura com um costume e criação de um novo paradigma. Esperamos pois que a presente crise, abra ruptura com o síndrome do individualismo, egoísmo individual e de grupo e a exploração selvagem do homem pelo homem. Já que este vírus revelou que atinge todos: ricos, pobres, poderosos ou não…
Jorge Henriques Santos
Jornalista
CPJ 3354A