Nas Jornadas de Caria e a Região, do 1º Fórum Força do Interior, o Dr. Lopes Marcelo. começou por fazer uma referência à importância de nos podermos voltar a encontrar e olhar olhos nos olhos, para poder refletir as nossas experiências, salientando que a sua experiência de vida e de conhecimento, tem origem nas suas raízes rurais, filho de pais analfabetos vivendo a sua vida rural na aldeia de Aranhas, Penamacor. Começou por chamar a atenção para os “diferentes alfabetos”, o alfabeto da academia e o alfabeto do conhecimento da natureza, das vivências e convivências rurais, do saber produzir e do saber fazer.
Reportou-nos depois para o desfazer de alguns equívocos, para já na lógica produtiva, com diferença entre a desertificação e o despovoamento, onde um é que leva ao outro, num fenómeno provocado pela presença da água, especificando de forma muito didática a relação entre as plantas de fruto e a invasão das herbáceas e a própria cadeia animal, que por falta de intervenção do homem é o despovoamento que leva à desertificação dos solos.
Outro tópico foi a observação da memória como faculdade da humanidade, para ter consciência do seu presente e construir o futuro. Salientando a tradição, como por definição aquilo que resistiu, que perdurou, referindo o projeto à Lareira da Memória, que desenvolveu em Penamacor, como um bom exercício nesse sentido. Referindo que a economia se converte numa espécie de foz de um rio no mar, mas onde a água só chega se for cuidada nos leitos do rio, nas ribeiras e nas fontes. Onde a identidade cultural deriva do património da nossa memória, tanto material como imaterial.
Com base nisso referiu outro tópico como fator importante destas terras que parecem angustiadas pela sua baixa densidade, mas onde a comunidade de origem não se fica no irrisório número dos que lá vivem, dando como exemplo que a sua aldeia, apenas com duas centenas de habitantes, tem uma base de dados com mais de 10 mil pessoas, “são os que têm ali a pátria dos seus afetos”, sabem onde estão e o que eles fazem… “É um património incomparável que nenhum capitalismo nem nenhuma moeda pode expressar”.
Referiu-se depois às vias rápidas de comunicação, como “o túnel que é a A/23”, cujo efeito é mais para nos isolar do que para nos servir. No sentido de que “nos tiram a carne e fica apenas o esqueleto, o esqueleto para se passar depressa e andarmos sempre a correr para não chegar a lado nenhum”. Salientou que não é só pela lei da oferta e da procura, que o desenvolvimento se faz, não é pelo mercado que Caria, ou Aranhas ou Penamacor, têm mais-valia. A Herança cultural nunca será mercadoria, mas as suas caraterísticas serão o fator diferenciador que nos pode caraterizar, o qual só se consegue se preservarmos as nossas raízes e as nossas tradições. “Não nos chega a camisa que já temos para passarmos a vida a discutir a gravata quando afinal a gravata é o que menos importa porque é um adereço”, disse no seu peculiar jeito eloquente de quem nos envolve de sentimento, no modo apaixonado e poético com que comunica.
Concluindo com a ideia de uma “Cultura Territorial bem enraizada”, “estudarmos a nossa memória e resgatá-la, procurando ser interativo e trazer para o terreiro os próprios agentes e portadores da memória” “Aquilo que nos diferencia é aquilo que é a nossa bandeira cultural”, concluiu Lopes Marcelo