Natural do Teixoso, casado em Belmonte e residente em Caria. Radialista de opção e paixão desde muito novo, com passagem por várias rádios, mas que se tornou numa das vozes mais emblemáticas do universo da rádio na região, ao serviço da Rádio Caria durante 22 anos. Acaba de se aposentar aos 44 anos, por motivos de saúde. Uma entrevista que se impunha, ao jornal da terra neste virar de página de Hélder Figueira.
Jorge Henriques Santos
Correio de Caria: Onde nasceu e cresceu o Hélder?
Hélder Figueira: Eu nasci no Teixoso, concelho da Covilhã, o meu pai é natural da Borralheira do Teixoso e a minha Mãe é natural da Boidobra, mas cresceu praticamente aqui em Caria,
C.C: – Como veio para Caria
H.F: -Os meus pais compraram casa aqui em Caria e eu vim para cá, isto em 1999. Depois casei cá, a minha esposa embora não sendo daqui vivia cá.
C.C: – Têm filhos?
H.F: -Um rapazão com 15 anos que está a estudar na Covilhã, na Campos Melo.
C.C: – Onde estudou?
H.F: -Primeiro na Escola Primária e depois o secundário no Agrupamento de Escolas Pedro Alvares Cabral, em Belmonte e só mais recentemente fiz o 12º ano porque não o tinha, na Escola Campos Melo na Covilhã, pois tinha ficado para trás.
C.C: – Ficou para trás porquê? Saúde?!
H.F: -Não, ficou para trás por causa do meu amor à rádio (risos).
C.C: – Então começou na rádio quando?
H.F: -Olhe eu comecei na rádio em 1992 (com 14 anos). Na rádio Jornal do Fundão, na altura em que a Dulce Gabriel e a Lúcia Reis ali estavam. Porém a minha participação era mais à distância, eu cobria os acontecimentos mais importantes do concelho de Belmonte. Lá ia eu com o meu gravadorsinho, fazia o relato do evento pelo telefone e depois punha o gravador junto ao auscultador para debitar o som que eles lá gravam no estúdio, que era assim que as coisas se faziam antes.
C.C: – Mas essa vocação da rádio veio porquê?
H.F: -Acho que esta paixão veio de sempre, eu mesmo antes de me iniciar na rádio, sempre tive curiosidade de acompanhar o percurso dos rádios piratas e eu ainda antes de entrar no Mundo da rádio andei por aí a fazer bailaricos.
C.C: – Mas com uma aparelhagem, ou a tocar?
H.F: -Animava bailes com órgão, porque eu tenho formação musical também, como o meu amigo Virgílio Faleiro e outros, eu andava também por aí nessa animação, mas não era bem aquilo que eu queria.
C.C: – A formação musical fez aonde?
H.F: -Fiz em Belmonte e com duas grandes referências que já não estão entre nós, o professor Amaral, de Gonçalo e o professor Rocha que era de Peraboa, foram duas pessoas me ensinaram muito.
C.C: – Evoluiu lá então?!
H.F: -Eu sou praticamente autodidata, porque quem tem um problema de visão ou outro, desenvolve mais os outros sentidos e eu como gostava muito de música e ouvia muito, quase sem me dar conta estava a saber tocar, depois era uma coisa de aperfeiçoar as coisas e aprofundar os conhecimentos. Na altura a Escola de Belmonte funcionava onde é hoje o Quartel do Bombeiros.
C.C: – Então foi a rádio Jornal do Fundão e depois, a rádio Caria?
H.F: -A rádio Caria foi onde estive mais tempo, mas foi o meu quarto projeto. Depois da Rádio Jornal do Fundão ingressei na Rádio Clube da Covilhã, onde estive com a Patrícia Figueiredo que hoje está na SIC, e o Luís Fonseca da Agência Lusa. Aliás eles puxaram-me muito as orelhas e eu bebi muito deles porque sempre foram pessoas com muito conhecimento na área.
C.C: – E depois da Rádio Club da Covilhã?
H.F: –Depois da RCC, surgiu a oportunidade de ir tirar um Curso numa Escola de Formação para pessoas portadoras de deficiência, o CIDEF – Centro de Inovação para Deficientes. Aprendia-se ali muito, mas muito na área da informática e saíram dali pessoas com formação e com estágio que foi importante ferramenta para a vida. Eu não, porque de todo não era aquilo que eu queria.
C.C: – Mas na área da Comunicação não?
H.F: -Na área da comunicação não, mas eu li por acaso um anúncio de jornal onde a Rádio Capital estava a pedir alguém que substituísse uma rapariga que ia ter bebé. Então eu pensei bem, dá jeito e sempre é algum que se ganha. Fui responder ao anúncio disseram-me logo, “você tem uma voz excelente, faz muito bem…” (com risos e voz distorcida). Eu pensei que estavam só a ser simpáticos, nunca mais se vão lembrar de mim, mas para meu espanto, depois me ligam e me propõem começar a fazer programa. A Rádio Capital transmitia em 100.8 FM para Lisboa e 102.7FM para o Porto e tinha também transmissão via satélite através do EUTELOSTAT 2F2 para a Europa e Norte de Africa, hoje estas frequências são usadas pela MEO Sudoeste. Foi uma experiência muito gratificante porque foi ali que eu aprendi muito, muito em termos de rádio.
C.C: – Em que departamento trabalhou?
H.F: -Eu estive só na parte da animação, eu fazia um horário muito bom para se fazer rádio (risos) que era das 2h às 6h da manhã, que é aquele horário mais giro para fazer rádio.
C.C: – Sim, nesse horário é um auditório muito próprio, mas em termos de rádio local não sei!?
H.F: -Lá está, em Lisboa e Porto é um nicho muito próprio, é um auditório específico, mas tem auditório. Aqui claro que não.
Depois acabei o meu curso…
C.C: – Então esse trabalho na rádio era simultâneo com o curso?
H.F: -Sim era, foi um período de loucos, o Curso durante o dia e a rádio todas as noites. Inicialmente vivia em casa de uma tia na Amora, depois acabei por ir para Lisboa. Era uma vida complicada, mas quando se é novo nada dói… uma pessoa com 20 anos quer lá saber…
C.C: – Então o Curso acabou e voltou cá para a terra?
H.F: -Eu tive uma proposta para ficar na Rádio Comercial, mas não quis por dois motivos, por um lado a situação da Rádio Comercial não era muito favorável e por outro, tinha motivos pessoais que me puxavam muito cá para cima…
C.C: – Então veio para cima e…?
H.F: -E se me perguntarem torces a orelha, claro que sim, quem é que não gostava de hoje em dia ter um emprego na Rádio Comercial, mas se tivesse isso não teria outras coisas que hoje tenho, o filho que tenho hoje, a esposa que tenho. Quando vim para cima, vinha com aquele desígnio de fazer o 12º ano.
C.C: – Porém?!
H.F: -Porém, liga-me o Dr. Geraldes, na altura diretor da Rádio Caria, e diz-me, não queres vir aqui para a rádio. Ora, ora, … (risos) Eu quando vim de Lisboa já não vim a tempo de me matricular no ano letivo 98/99, depois para 2000 já estava na rádio também já não deu.
C.C: – Então entrou para a Rádio Caria a fazer o quê?
H.F: -Comecei logo a fazer animação. Claro que era uma realidade completamente diferente da Rádio Capital, tanto em termos dos meios técnicos como logísticos. As rádios locais e a Rádio Caria não eram exceção.
C.C: – Passatempos e outro tipo de programa não fez?
H.F: -Passatempos tive alguns também, depois tive um grande projeto em programa da tarde que era o “Ganda Som”, era um programa que assentava sobretudo na novidade musical, como estava bem dentro do meio, tudo o que saía eu passava e o programa tinha sucesso.
Quando eu cheguei à Rádio Caria, passava-se muito música antiga, tipo Frank Sinatra. Joe de San etc., coisas que são agradáveis de ouvir, mas não podem fazer parte maioritária da grelha de uma rádio local.
C.C: – Mas o que o tornou popular e reconhecido pelo grande auditório foi os discos pedidos?
H.F: -Eu não gosto de acreditar nessa popularidade, ou “grande reconhecimento”, até porque gosto mais de fazer sonoplastia do que locução.
C.C: – Quem diria!!?
H.F: -É verdade, eu gosto do contato com as pessoas e a rádio é um excelente meio para isso, dá-me muita alegria e satisfação perceber que há um vasto leque de pessoas que nos acompanham, ouvem diariamente e nesta fase da minha vida, os telefonemas, as mensagens nas redes sociais, foram prova disso. Porém realizar um trabalho de montagem para um noticiário, para um anúncio, ou um genérico de entrada, um trabalho por vezes de muitas horas para uma peça de poucos minutos, é uma coisa que eu adoro.
C.C: – Mas a componente do contato pessoal também lhe agrada!?
H.F: -Junto com a locução são coisas que se complementam e por isso fui ficando e engraçado que apesar de sentir que muitas vezes estava ali a passar todos os dias as mesmas músicas, para um leque de pessoas que pouco variava, dava comigo a pensar, mas a senhora fulana hoje ainda não ligou, será que se passa alguma coisa? Porque se vai criando ali uma empatia, uma família, um grupo fechado que se vai abrindo.
C.C: – Há assim algum aspeto que tenha marcado e queira destacar?
H.F: -Tenho vários trabalhos em que participei, alguns que ainda guardo e foram marcantes, mas acima de tudo foi a oportunidade de privar e conhecer pessoas como o Herman José, o Nelson e o Sérgio, dos Anjos, que se não fosse a Rádio Caria e os outros projetos, não teria. Olhe a oportunidade de gravar um spot publicitário com o Augusto Seabra que é a voz OFF da SIC.
C.C: – Já nos falou dessa limitação na visão que naturalmente é um obstáculo. Este percurso foi de alguma forma um modo de se superar?
H.F: -Quando eu cresci não havia a sensibilidade que hoje há para a integração de pessoas com dificuldade ou deficiências. Antigamente sofria-se muito, (e nem se chamava assim) por bullying, quer físico quer psicológico, mas acho que isso me ajudou ainda a ser mais forte, frases como “o quatro olhos”, “o caixa de óculos”, tem algum impacto numa criança com seis, sete anos. Então descobri que a melhor forma de dar a volta a isso era fazer piada precisamente com isso e isso passou a deixar de ter importância para os outros e a me divertir também a mim. Mas quando eu sinto que deixam de fazer “bullying” comigo e quando ingresso na rádio…
C.C: – Ficou com mais admiradoras do que qualquer um!?
H.F: Isso acontece, mas depois quando me viam desiludiam-se KK (risos). Olhe a minha esposa por acaso é resultado disso, já me conhecia, depois passou a ouvir… Mas eu nunca tive assim um clube de fans por aí além. Reconheço que tenho muitas pessoas que gostaram e gostam do meu trabalho.
C.C: – Esse problema de visão o que é concretamente?
H.F: Nasci com catarata, estrabismo e miopia. Uma panóplia de coisas…
C.C: – Mas depois de estar aqui houve quem o apoiasse nesse problema da visão?
H.F: Sim, já estava aqui na rádio Caria e na altura houve duas pessoas, a quem eu agradeço até hoje profundamente: ao José Soares que na altura era diretor comercial da Rádio Caria e também a uma senhora que é a Maria José Buritim que também teve aqui um papel diretivo na Rádio Caria e muito graças a essas duas pessoas, não à Rádio Caria em si, mas a estas duas pessoas eu fui levado para o Porto em 2001 e fui intervencionado quer na vista direita, quer na vista esquerda e fiz a implantação do cristalino artificial.
C.C: – E isto aumentou substancialmente a sua capacidade de visão?!
H.F: Sim sem dúvida, eu antes usava uns óculos tipo fundo de garrafa que eram superpesados, quando chegava o verão eu andava constantemente com o nariz em ferida. Agora uso estes óculos que não tem nada a ver e aumentei substancialmente a visão.
C.C: – Entretanto agora acontece uma retirada da rádio também por motivo de saúde!?
H.F: Eu pus nas minhas redes sociais o que se estava a passar, mas será bom que explique o que se está a passar com o Hélder, até porque parece que têm circulado versões que não são as mais corretas. Circulam rumores que o Hélder está muito mal que o Hélder está acamado.
De facto, eu tive, e ainda tenho um problema Oncológico, tenho estado a ser tratado de um cancro colorretal, era um T3 N1 M0 – ou seja já era grandinho, já começava a fazer alguns disparates e M0 significa que não tinha metástases.
C.C: – Foi diagnosticado quando?
H.F: Foi diagnosticado no final de 2020, confirmado a sério em janeiro de 2021, com tratamentos a começar em Coimbra em março de 2021, radioterapia e quimioterapia, acabando em abril. De abril a junho descansei em casa, depois tinha a cirurgia a 21 de junho 2021. No meu caso adiantou operar, o tumor foi retirado, tive alguns dias menos bem, mas felizmente está tudo a correr bem. Mas é importante esclarecer as pessoas que o Hélder deixou a rádio porque fiquei com colostomia definitiva, mais o problema visual que tenho, foi-me atribuída uma incapacidade de 96%. Consegui uma aposentação por incapacidade e tive de pensar na minha vida e no futuro.
C.C: – Fica com essa limitação, mas está fora de perigo?
H.F: Sim, em princípio sim, mas não teria condições de continuar a trabalhar, tendo em conta que o trabalho nas rádios locais também é o que a gente sabe… e tive de pensar no meu bem-estar pessoal e financeiro… assim como da minha família.
Quero agradecer também ao Dr. Pinto Ferreira que me conhece de tenra idade e também ao Dr. Guilhermo Pastor que foi ele que me operou, a minha vida esteve cinco horas nas mãos dele e daquela equipa médica. Depois no Centro de Saúde de Belmonte, à Dra. Celina Pires, o Dr. Geraldes, que de vez em quando já me liga.
C.C: – Duas questões finais
Uma mensagem para o auditório e projetos para o Futuro!?
H.F: A mensagem é dizer que o Hélder está vivo, não está de boa saúde, porque se estivesse não estaria nesta situação, mas está melhor de vida e de boa disposição. Agradeço tudo o que me deram ao longo destes anos, agradeço o carinho que me deram enquanto estive aos microfones não só da rádio Caria, mas de todos os projetos onde estive, o apoio e carinho que recebo todos os dias através das redes sociais, das chamadas telefónicas e os que têm perguntado por mim diretamente ou a terceiros. Assim como aos colegas de trabalho e pessoas da direção que se preocuparam e sempre estiveram comigo.
Quanto ao futuro, para já darei mais atenção à família, em 22 anos de rádio eu mal vi o meu filho crescer. Ideias há sempre muitas, mas ainda é cedo para projetos e como sempre, o futuro a Deus pertence.